Confesso que está cada vez mais difícil escrever. Aliás, está ficando cada vez mais difícil acordar e sair para olhar o mundo. O que se vê? Morte, destruição, choro e sofrimento. O mais difícil, entretanto, é comprovar com que simplicidade e naturalidade vidas e esperanças são destruídas. É mais grave, ainda, o olhar de naturalidade sobre o sofrimento. Não é conosco, dirão. Até quando?
Existe algo errado. Muito errado. Existe um erro histórico e milenar que orienta para a infelicidade e sofrimento crescentes das gerações humanas. O enorme patrimônio construído, em todas as áreas, por nós e por todos que nos antecederam não está bem distribuído. Isso é fato e não especulação.
É fácil, na verdade inconsciência, alternar gozo e sofrimento dentro do pequeno tempo. É muito fácil tornar-se prisioneiro do pequeno tempo. O pequeno tempo não deixa ver que a viagem que hoje fazemos por uma estrada asfaltada, ouvindo nossa música preferida e numa temperatura climatizada a nosso gosto, só se tornou possível a partir dos calos que temos nas mãos e que foram escondidos pelo grande tempo. Não ver estes calos não significa que não os temos. O asfalto negro está ali colocado por milhares de almas brancas. O pequeno tempo deixa à vista o asfalto negro, o grande tempo esconde o sofrimento que tornou possível ele estar ali: o sofrimento das almas brancas.
O pequeno tempo torna fácil chamar de inferior, e muitas vezes humilhar e fazer sofrer, membros de uma genealogia que é responsável direta pelo gozo e vida fácil que temos agora. Sentimento de grandeza e ignorância são irmãs siamesas.
A verdade é que nenhuma ciência, religião ou filosofia conseguiu trazer felicidade à humanidade. Todas, entretanto, se dizem proprietárias da fórmula mágica que conduz a humanidade a um caminho completo e feliz. Será?
Tudo que é construído dentro da ilusão do pequeno tempo é, também, ilusão. É momento, e o momento é sério, de deixarmos as brincadeirinhas do pequeno tempo e tomarmos consciência maior do grande tempo. É esta consciência que vai nos permitir descobrir que, se prisões existem, elas foram construídas por nós mesmos. Que fora do tempo não há prisões e que “Filhos do Espaço” são “Prisioneiros do Tempo” por autocondenação.